SOBRE
VULTUS
Nasci em Lisboa. Vim para Évora com 4 anos. Parti para um longo exílio aos 17. Passados 20 anos, regressei às paisagens que me marcaram, agora desconhecidas e transformadas. Hoje podia partir outra vez. As minhas paisagens são o meu universo para além de mim.
Já mudei a minha existência várias vezes e essa procura só confirma essas incertezas. Em Paris, pela primeira vez, comecei a habituar-me ao escuro, no cinema. Ter filhos veio questionar a ligação aos lugares aonde me encontrava. Depois de ver cinema e ouvir jazz, iniciei a marcação do espaço, VER sequências e ver sombras a mover-se com a luz no meio, Paris. A música, o canto e a dança ajudaram-me a voar com o que sentia, Amesterdão VER. Ainda procurei um outro lugar (Suécia, Canada), mas decidi pela Holanda. A língua desconhecida que ia aprendendo concentrou ainda mais o que então começaria a ser o encontro difícil com o meu trabalho fotográfico.
O estudar fotografia foi importante. A técnica que aprendi, deu-me luta e segurança. A minha existência passaria a ser entre Amsterdão e Lisboa. A fotografia, a minha preocupação com uma vida vivida num olhar para detrás dos meus olhos. Quando acabei os estudos, fiz parte do grupo “Perspektief”, que tentava expor e publicar trabalhos de outros jovens fotógrafos, além dos nossos. Acabou por mudar o ambiente fotográfico holandês e o meu ser também, não sei bem como. A partir dessa galeria, retive vários contactos, com os quais vi o trabalho de outros fotógrafos e fui questionado o que eu próprio realizava. Em 1982, é-me atribuído um prémio-bolsa a nível nacional holandês. Comecei a ter exposições e publicar até agora.
A atribuição do Prémio Pessoa em 1999, em Portugal (ex-aequo com o poeta Manuel Alegre), ajudou a consolidar o meu trabalho e tive mais liberdade de ação. A arte abstrata com as suas cores e formas que se movem em diferentes direções duma maneira emocional que tinha visto de uma outra forma nas salas escuras do cinema, bem como a música, a dança e o canto ajudam-me a compreender o que se passa entre mim e a fotografia. A Holanda ensina-me que também tenho uma parte de vida normal que até então fingia que não me interessava. Divido esse tempo fotografando e imprimindo algumas fotografias. Na câmara escura entre as nuances do equilíbrio do que tinha fixado antes e a magia da aparição da imagem fotográfica, medito muitas vezes e é nesse espaço que importantes decisões são tomadas.
Trabalhei na academia de Arquitetura de Amesterdão, que viria a acentuar o encontro entre a forma e o lugar iluminado, durante dez anos. De volta em Portugal, encontrei um mundo diferente, que me isolou com a natureza e as pessoas que fui encontrando.
No ato de fotografar, encontro os meus olhos ligados ao pensamento da contemplação. Entre o preto e o branco fico vendo passar as nuances como água. Já não sei se o essencial está nos extremos. Cada momento é outro e mais outro, mas todos ligados entre si são o espaço da materialização da imagem. E o corpo a dor, o medo do prazer conseguem penetrar nas paredes deste espaço. Comecei a ver que a luz é formada por muitas cores. Interesso-me pela repetição e multiplicação da forma para atingir a perda do significado e encontrar a síntese da essência. O trabalho dum fotografo reduz-se a uns segundos numa vida inteira. A fotografia, à eternidade. Sempre trabalhei muito. Quando não tenho nada para fazer, olho.
José.